quinta-feira, 5 de novembro de 2009

Trabalho Escravo e Técnologias Modernas

Trabalho Escravo e Técnologias Modernas

Nestes dias, acabei me encontrando com cinco trabalhadores do Município de Ouricuri PE, que foram plantar cana numa fazenda, em Mato Grosso. Segundo depoimento dos mesmos, eram obrigados a trabalhar durante 12 horas por dia, sem parar. O trabalho era tão brutalizado, que muitos não resistiam e desmaiavam principalmente aqueles que picavam a cana nas valas. Um deles disse assim: senti, na pele, o que é trabalho escravo, onde o feitor olha para a gente como se não fôssemos nada, apenas produtores de riquezas para o patrão.
No Brasil, a escravidão continua muito presente. Desde 1500, com a escravidão dos indígenas, depois, a escravidão dos negros, e hoje a chamada escravidão da peonagem nos cortes de cana, exploração de minas, fazendas de gado, podemos dizer que a acumulação de riquezas, no Brasil, ainda se dá muito mais por meio da violência, do trabalho não pago e brutalizado. É muito comum encontrarmos sertão adentro, em fazendas, trabalhadores trabalhando apenas pela comida ou por uma quantia irrisória de 5 a 10 reais por dia, com jornada de mais de 10 horas. Isso mostra claramente como o capital acumula riquezas por meio do trabalho não pago e de forma violenta.
O que nos deixa perplexos é o fato da sociedade, no chamado tempo cotidiano, tem a compreensão que a escravidão não existe mais, e quando disse para os trabalhadores que aquelas formas de plantar cana, de cortar, constituíam em relações escravocratas, desumanas, um deles disse assim “pelo que sei já foi assinada a lei que deu fim ao trabalho escravo. Nosso Brasil não tem mais trabalho escravo". Infelizmente, essa é a leitura feita pela escola e meios de comunicação de massa que ao invés de ajudar as pessoas a se verem dentro das contradições da sociedade, ajudam bestializar, idiotizar ainda mais as pessoas. Em função disto, as pessoas não se vêem escravizadas, domesticadas, negadas até as últimas conseqüências. Têm muito forte a compreensão de que a riqueza acumulada nas mãos de alguns é fruto da capacidade, da inteligência e da proteção divina. Não se dão conta das diversas formas que os ricos exploram as classes trabalhadoras, apropriando-se do trabalho não pago. Nunca, na história do capitalismo, o trabalho não pago foi tão forte como na atualidade.
A substituição, de até 150 trabalhadores por uma baita máquina que corta cana, significa dizer que a produção desta máquina acumulou mais valia nas mãos da empresa, agora, nas mãos de um trabalhador fazendo a operação, responde pelo trabalho de 150 trabalhadores. A complexidade das relações capital trabalho, acumulação de riquezas, requerem produções tecnológicas cada vez mais excludentes e que acabam obrigando os excluídos a buscarem formas de trabalho no mundo do crime: roubos, pistolagem, assaltos, mundo do narcotráfico, do sexo... Faz crescer uma massa de gente que não consegue mais se aperceber nem dentro do tempo estrutural, conjuntural e cotidiano, ou seja, desterritorializando, descontextualizando e individualizando cada vez mais o ser humano. Quando mais são modernizadas as tecnologias apropriadas pelo capital, mais crescem as brutalisações no mundo.

Derlí Casali – Membro da Direção Regional/NE do Movimento dos Pequenos Agricultores – MPA

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